Abstract:
A ditadura militar brasileira usou obras públicas de forma decidida como uma narrativa de progresso. O regime concentrou-se na promoção de projetos de grande visibilidade, capazes de quebrar recordes nacionais e internacionais por suas dimensões. A ponte Rio-Niterói, por exemplo, era a mais longa do mundo no seu gênero na época em que foi terminada, em 1974. Ao se concentrar em grandes projetos, a ditadura militar gerava uma agitação em torno de suas realizações, na esperança de ofuscar o caráter regressivo de sua política social. Instituiu até uma semana nacional do transporte, organizou uma antologia de obras literárias ligadas ao tema e promoveu um concurso para o melhor poema sobre a rodovia Transamazônica, que estava construindo. Assim, o regime simultaneamente realizava grandes obras públicas e construía uma narrativa sobre o seu significado para os cidadãos. Ao mesmo tempo, essas obras foram tematizadas pela ficção contemporânea. Por quê? Minha hipótese é que retratos imaginosos de tais obras ajudaram artistas a criar tensão dramática, humor e posturas éticas que eram culturalmente relevantes para os seus leitores. Além disso, a ficção oferecia um espaço criativo para se explorarem conotações simbólicas alternativas dos projetos cultuados pelo regime militar.